A copa e o resgate do elogio, por Claudio Furtado*

Recentemente, uma jornalista me falou que o elogio não faz parte do dicionário da imprensa. Discordo. Acho que o elogio é fundamental, até para alimentar e fortalecer a virtude do ser humano. Aliás, a onda de pessimismo que varria nosso país na pré-Copa foi quebrada pelos inúmeros e favoráveis depoimentos dos milhares de turistas, registrados pela própria mídia, de que nem tudo está errado neste país como parecia.

As belezas naturais do Brasil, ninguém as desconhece. Mas são muitos os resultados positivos deixados pela Copa do Mundo. Para nós, porto-alegrenses, e gaúchos em geral, só a presença de cerca de 350 mil turistas por aqui já valeu o investimento, toda a nossa expectativa. Só que, certamente, um dos maiores legados da Copa foi o resgate da autoestima, graças, em muito, aos turistas que nos visitaram.

Falaram, sem censura, que somos um povo alegre, agradável; que sabemos receber quem nos visita; que organizamos muito bem esta Copa do Mundo.

A crítica construtiva é fundamental para o aprimoramento. Só que elogiar era, até então, quase um verbo proibido, de Norte a Sul. Infelizmente os maus exemplos têm sido priorizados, supervalorizados. O bem virou exceção. Se temos políticos, empresários, jornalistas, funcionários públicos, operários, enfim, pessoas corruptas, a imensa maioria é gente honesta, bem-intencionada. É óbvio que o olhar do turista é rápido e curto. Ele não vai ao enterro, só à festa. Mas ele viu o que estava, digamos, escondido, até de nós mesmos.

A Copa está indo embora, um longo caminho a percorrer até a Rússia. Tem gente até com sintomas de DPC (Depressão Pós-Copa). Fica a saudade, acompanhada do resgate público do nosso imenso valor. Este título já é nosso.

 

* JORNALISTA

Fonte: ZH, 03 de julho de 2014 | N° 17848